A diferença entre remédio e veneno é a dose
Você já parou para pensar no que faz com que a Terra seja habitável? O grande responsável por isso é o efeito estufa, um processo natural por meio do qual alguns gases presentes na atmosfera retêm parte do calor do Sol. Sem esse fenômeno, o planeta seria uma bola de gelo a -19°C, inviável para formas de vida complexas, cujo desenvolvimento depende de água líquida. O problema é que a diferença entre remédio e veneno é a dose: as ações humanas no último século e meio têm intensificado o efeito estufa, aumentando descontroladamente a temperatura e causando as mudanças climáticas.
O Sol envia energia para o planeta
Cada metro quadrado da Terra recebe, a cada segundo, 342 Watts de radiação solar.
Para entender o efeito estufa e seu gêmeo maligno, o aquecimento global, é preciso viajar 149 milhões de quilômetros pelo espaço até o lugar que comanda a máquina do clima da Terra: o Sol. A estrela envia energia para nosso planeta na forma de radiação eletromagnética (luz) de vários tipos. A maior parte é luz visível, mas também recebemos radiação ultravioleta, raios X, raios gama e infravermelho. Cada metro quadrado da Terra recebe, a cada segundo, 342 Watts de radiação solar (para comparação, o Sol produz 386 quatrilhões de megawatts de energia por segundo). Parte dessa radiação emitida pelo Sol volta para o espaço, rebatida por nuvens e por aerossóis na alta atmosfera. Parte é refletida por superfícies claras do planeta, como gelo, neve e desertos, que têm alto poder de reflexão (conhecido como “albedo”). E uma parte dessa radiação — cerca de 240 W/m2 — é absorvida pela superfície terrestre e pela atmosfera, pondo em marcha ventos e correntes marinhas e permitindo a fotossíntese.
A radiação solar absorvida pela superfície terrestre é reemitida na forma de raios infravermelhos, ou calor. Tudo na Terra — plantas, animais, objetos — emite essa radiação de grande comprimento de onda. Os 240 W/m2 absorvidos deveriam voltar ao espaço na forma de infravermelho. Se isso acontecesse, a temperatura na superfície terrestre seria de 19ºC negativos. Em vez disso, a média na Terra é de 15ºC positivos. Por quê?
Ocorre que o calor reemitido é impedido de retornar imediatamente. Ele é retido na atmosfera por uma espécie de cobertor de gases, que existem em pequena proporção no ar, mas são extremamente eficientes em absorver luz na frequência do infravermelho. Os principais desses gases são o vapor d’ água, o dióxido de carbono (CO2 ), o metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O). Essas moléculas, chamadas gases de efeito estufa, absorvem a energia térmica e a reemitem em várias direções, aumentando a temperatura do planeta. O vapor d’água é o gás de efeito estufa mais abundante, mas sua presença na atmosfera é regulada pelos outros gases, principalmente o CO2 (é preciso haver evaporação para que haja vapor d’água no ar).
A medida do desequilíbrio entre a energia que chega à Terra a cada segundo e a que sai é chamada de forçante radiativa. Há fatores de forçamento radiativo positivo, como gases de efeito estufa e variações na irradiação solar, e negativo, como a camada de ozônio na estratosfera e aerossóis emitidos por poluição humana ou por erupções vulcânicas. Quando essas forças estão desequilibradas, a temperatura média do nosso planeta se torna mais quente ou mais fria.
Vulcões podem lançar dióxido de enxofre (SO2) na estratosfera, onde esse gás se converte em ácido sulfúrico que, ao se condensar rapidamente, forma aerossóis finos de sulfato. Estes componentes rebatem a radiação solar, ajudando a resfriar o planeta. O efeito pode durar mais de um ano, como no caso da erupção do monte Pinatubo, nas Filipinas, em 1991, que resfriou o planeta em 0,2ºC a 0,5ºC por mais de dois anos.
A ciência vem medindo todos os fatores de forçamento radiativo da Terra e concluiu que, nas últimas décadas, os gases-estufa emitidos por atividades humanas desde o início da Revolução Industrial são os principais fatores de desequilíbrio, levando o planeta a esquentar muito e rapidamente. A quantidade de dióxido de carbono é intensificada principalmente pela queima de combustíveis fósseis e pelo desmatamento, enquanto o metano e o óxido nitroso têm como principais fontes a agropecuária. Segundo o IPCC, em 2019 os humanos haviam aumentado em 2,72 Watts por metro quadrado a energia retida no planeta em comparação com o período anterior à Revolução Industrial. É como se tivéssemos ligado oito lâmpadas de árvore de Natal em cada metro quadrado da superfície do planeta.
Além disso, mudanças no albedo da Terra — causadas pela redução de áreas cobertas por gelo e neve —, também têm contribuído para intensificar o desequilíbrio energético. Em resumo, estamos prendendo muito calor na atmosfera ao descontrolar o efeito estufa. É por isso que estamos enfrentando uma crise climática.
