A convenção do clima
Uma resposta global para um problema global
A comoção criada na opinião pública em torno da ideia da mudança do clima provocada por humanos no final da década de 1980, a descoberta do buraco na camada de ozônio, a criação do conceito de desenvolvimento sustentável, em 1987, e o primeiro relatório do IPCC, em 1990, levaram a ONU a propor a criação de uma convenção internacional sobre as alterações climáticas. Em 1992, durante a Rio-92, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, foi adotada a UNFCCC (sigla em inglês para Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima). A solução multilateral, onde cada país tem voz e voto, parecia a mais democrática para lidar com um problema que é global por excelência.
Em seu artigo segundo, a convenção estabelecia:
“O objetivo final desta Convenção e de quaisquer instrumentos jurídicos com ela relacionados que adote a Conferência das Partes é o de alcançar, em conformidade com as disposições pertinentes desta Convenção, a estabilização das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera num nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático. Esse nível deverá ser alcançado num prazo suficiente que permita aos ecossistemas adaptarem-se naturalmente à mudança do clima, que assegure que a produção de alimentos não seja ameaçada e que permita ao desenvolvimento econômico prosseguir de maneira sustentável.”
A UNFCCC tem alguns princípios de funcionamento que até hoje influenciam as negociações internacionais sobre o combate à mudança climática. O mais importante deles é o das chamadas responsabilidades comuns, mas diferenciadas e respectivas capacidades (CBDR-RC). Segundo esse princípio, os países que mais fizeram para causar a crise do clima, os industrializados, devem fazer mais para resolvê-la, seja adotando medidas mais estritas de corte de emissões, seja financiando a mitigação e a adaptação nos países mais pobres. A diferenciação entre as nações também é um princípio fundamental: na convenção, os países foram divididos em Anexo 1 (industrializados mais as chamadas “economias de transição”, o ex-bloco socialista) e não-Anexo 1 (o resto).
A fim de implementar o objetivo da UNFCCC de impedir a humanidade de destruir o clima da Terra, os países-membros da convenção (hoje 197 mais a União Europeia) passaram a se reunir anualmente a partir de 1994, quando o tratado entrou em vigor. A primeira Conferência das Partes, ou COP, aconteceu em Berlim em 1995 e foi presidida pela então futura chanceler alemã Angela Merkel.
Pioneirismo em Kyoto
Na COP3, em Kyoto, Japão, foi adotado o primeiro instrumento legal para tentar cumprir a UNFCCC. O chamado Protocolo de Kyoto previa que os países do Anexo 1 cortassem suas emissões em 5,2% em relação a 1990 até 2012. Os países em desenvolvimento não tinham obrigações, mas poderiam participar do esforço global vendendo créditos de carbono — derivados da implementação de projetos de energia chamadas de limpa ou reflorestamento — às nações com metas a cumprir, por meio do chamado Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. Países ricos também poderiam comercializar direitos de poluir entre si, o que deu origem ao primeiro mercado de carbono do mundo, na União Europeia.
Os Estados Unidos se retiraram do Protocolo de Kyoto,
tornando-o essencialmente inútil para combater o aquecimento da Terra.
Em 2001, os EUA, que emitiam quase 40% do carbono do mundo industrializado, se retiraram do Protocolo de Kyoto, retardando sua ratificação e tornando-o essencialmente inútil para combater o aquecimento da Terra. Austrália e Canadá seguiram os EUA posteriormente. O tratado só entraria em vigor em 2005, com a ratificação russa. Mas seria preciso negociar uma extensão de Kyoto para entrar em vigor após 2012, ou um novo acordo, que envolvesse os EUA e os países em desenvolvimento, que no começo dos anos 2000 ultrapassaram as nações ricas como maiores emissores do planeta.
Copenhague: crônica de um fracasso
A COP15, marcada para 2009 em Copenhague, Dinamarca, tinha uma missão enorme para cumprir: fechar um acordo para além da vigência do Protocolo de Kyoto que envolvesse os EUA e os países em desenvolvimento. Havia otimismo no ar com a chegada de Barack Obama à Casa Branca, com a forte disseminação das energias renováveis e com o clima ocupando as discussões públicas e as manchetes dos jornais. Seria o maior encontro de chefes de Estado e governo da história.
Com tudo isso, porém, a cúpula foi um fracasso. Este já vinha anunciado desde as semanas anteriores à COP, quando Obama reuniu-se com o presidente chinês, Hu Jintao, em Cingapura, para fechar o entendimento que selaria o destino da cúpula: EUA e China não estavam preparados para um acordo legalmente vinculante como Kyoto. Propunham um acordo “politicamente vinculante”, algo a que a Europa resistia. Cada país diria à ONU, de forma voluntária, o que pretendia fazer para cortar emissões.
Erros da presidência dinamarquesa terminaram de fazer o caldo entornar, revoltando os países em desenvolvimento. No final da COP, sobrou para os presidentes e premiês de Brasil, França, Índia, EUA, China, Alemanha e África do Sul negociar uma declaração política chamada Acordo de Copenhague, que nem sequer pôde ser formalmente adotada no final da COP por oposição da Venezuela. Para não dizer que Copenhague foi um fiasco total, dois números fundamentais para o mundo apareceram pela primeira vez na COP15: os US$ 100 bilhões por ano que os países ricos prometeram levantar para os pobres a partir de 2015 (uma bravata improvisada de Hillary Clinton) e o 1,5°C de estabilização do aquecimento global que as nações insulares queriam (e conseguiram anos depois) transformar em meta global.